30/05/2019 08h39 – Atualizado em 30/05/2019 08h39
Com dívida de R$ 12 bi, Atvos (antiga Odebrecht Agro) entra em recuperação judicial
Por Redação
Com uma dívida de R$ 11,96 bilhões, a Atvos, braço sucroenergético do grupo Odebrecht, entrou nesta quarta-feira (29) com um pedido de recuperação judicial. O pleito foi protocolado na 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo e aprovado pelo juiz João de Oliveira Rodrigues Filho.
De acordo com o Valor Econômico, o grupo tentou, até o último momento, uma negociação amigável com detentores de R$ 11,1 bilhões em dívidas da Atvos. Porém, não houve acordo com Banco do Brasil e BNDES. Conforme a Folha de São Paulo, o BNDES é o maior dos credores, com R$ 4,1 bilhões a receber, em seguida vem Banco do Brasil, com R$ 3,8 bilhões. Na sequência estão a Caixa Econômica Federal, com R$ 530 milhões, o Itaú, com R$ 390 milhões, e o Bradesco, com R$ 260 milhões.
Segundo fontes próximas à renegociação, ouvidas pelo jornal O Estado de São Paulo, o tiro de misericórdia para a Atvos foi justamente a falta de consenso entre BNDES e Banco do Brasil. Os bancos públicos não aceitaram uma proposta de transformar parte da dívida em capital. Ainda que, nas últimas semanas, o Banco do Brasil tenha se movimentado mais em busca de uma solução, o banco de desenvolvimento não aceitou um acordo.
O site Valor Econômico ainda informa que a Odebrecht estava na mesa de negociação com o Banco do Brasil quando comunicou que o prazo para chegarem a um acordo tinha acabado, não restando alternativa a não ser pedir a proteção contra credores. Uma fonte do Banco Brasil consultada pelo jornal disse que o banco foi surpreendido e que estava empenhado na negociação.
A reportagem explica que, como a Atvos teria que depositar 65% da venda de etanol em favor do fundo Lone Star até sexta-feira, a companhia tinha até às 17h de ontem para entrar com o pedido de recuperação judicial. Se o Lone Star ficasse com o resultado da venda do etanol, teria vantagem em relação aos demais credores e asfixiaria a empresa.
Agora, com o aval da Justiça, a Atvos deverá apresentar um plano de recuperação dentro de 60 dias. Conforme apurou a reportagem da Folha de São Paulo, é bem provável que o plano implique numa perda expressiva para os credores, porque sua estrutura de capital não comporta mais que R$ 5 bilhões em dívida.
No pedido de recuperação judicial, ao qual a Folha teve acesso, a Atvos relata que vinha negociando uma “saída amigável” com os bancos, quando foi surpreendida por um “ataque específico e desgarrado” de um dos credores.
Segundo próximas ao processo, trata-se do fundo americano Lone Star, com o qual a companhia possui uma dívida de R$ 1,1 bilhão. Os americanos arrestaram na Justiça parte da receita com a venda de etanol, o que asfixiou financeiramente a empresa. Com a recuperação judicial, vão parar de receber o dinheiro.
Em nota à imprensa, a Atvos informou que “entrou com o pedido de recuperação judicial para preservar suas operações, garantir o equilíbrio financeiro e reforçar o seu compromisso com os mais de 10 mil empregados”. A empresa está sendo assessorada pelo escritório E. Munhoz Advogados e pela RK Partners.
“A iniciativa da Atvos preserva suas operações e visa garantir ambiente seguro e estável para o equilíbrio das suas contas, objetivando alcançar a sua capacidade máxima de produção nos próximos anos”, Luciano Guidolin (presidente do Grupo Odebrecht)
Além da dívida de quase R$ 12 bilhões, a empresa também tem débitos de R$ 3 bilhões com companhias do próprio grupo, totalizando R$ 15 bilhões.
Grupo pode estar em risco
O presidente Odebrecht S.A., Luciano Guidolin, também enviou comunicado aos funcionários a fim de tentar isolar o restante do grupo da crise. “O pedido da Atvos restringe-se a ela própria e não envolve a Odebrecht S.A, nem outras empresas”, disse.
Mas o fato é que parte das dívidas da Atvos tem avais concedidos pela Odebrecht S.A. Segundo informações do Valor Econômico, caso os credores decidam executar esses empréstimos, a holding não terá outro caminho a não ser recorrer à Justiça para pedir proteção. Ainda segundo o jornal, excluído os compromissos da petroquímica Braskem, a Odebrecht possui uma dívida bruta de aproximadamente R$ 80 bilhões – metade do valor comprometido com bancos nacionais.
Além disso, todo o grupo enfrenta uma situação financeira delicada. A construtora OEC está renegociando diretamente com os detentores de bônus no exterior uma dívida de US$ 3 bilhões (R$ 12 bilhões). As conversas não vêm sendo fáceis.
A OR, do ramo imobiliário, passa por dificuldades e está na mesa a possibilidade de também pedir uma trégua à Justiça. O estaleiro Enseada entrou em recuperação extrajudicial, mas seus negócios não vão bem. Apenas a Ocyan, de petróleo e gás, equacionou satisfatoriamente suas dívidas, enquanto a petroquímica Braskem vai bem.
Histórico da companhia
A Atvos – ainda com o nome de Odebrecht Agroindustrial – iniciou suas atividades em meados de 2007, no auge do poder político e dos negócios da família Odebrecht, que entrou em diferentes ramos e se endividou significativamente.
Hoje a companhia tem nove usinas de açúcar e álcool em São Paulo, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul e capacidade para produzir 700 mil toneladas de açúcar e 3 bilhões de litros de álcool combustível. É a segunda maior produtora de etanol do país.
O Grupo Atvos tem hoje aproximadamente 10.500 empregados diretos, gera cerca de 5.000 empregos junto
a seus prestadores de serviço diretos e proporciona a geração de mais de 30.000 empregos indiretos. Somente no estado de São Paulo, o Grupo Atvos promove, direta e indiretamente, mais de 40.000 empregos.
A empresa entrou em dificuldades pela primeira vez em 2016, após a prisão do herdeiro do grupo, Marcelo Odebrecht, por corromper políticos e funcionários públicos. Também agravou o problema a situação do setor de açúcar e álcool, que sofria com o congelamento do preço da gasolina pela Petrobras, tornando o etanol pouco rentável.
Na época, a então Odebrecht Agroindustrial promoveu uma primeira reestruturação de sua dívida, transferindo cerca de R$ 2 bilhões de débitos para sua holding e oferecendo em garantia ações da Braskem, até hoje a empresa mais saudável do conglomerado.
Itaú e Bradesco aproveitaram a operação e passaram boa parte de seus créditos para a holding e, por isso, estão menos expostos hoje à recuperação judicial da companhia do que as instituições públicas. A condição, no entanto, foi emprestar mais R$ 1 bilhão à família Odebrecht para injetar em outros negócios.
Já naquela época especialistas em reestruturação de empresas diziam que a melhor saída para a empresa de açúcar e álcool era a recuperação judicial, mas os Odebrecht resistiram, com receio de perder o crédito nos bancos e de que a crise engolfasse todo o grupo.
A empresa então mudou de nome para Atvos. Os problemas, contudo, persistiram conforme o previsto. No pedido de recuperação judicial, a companhia informa que perdeu R$ 1,2 bilhão de receita com a greve dos caminhoneiros e que sofreu com problemas climáticos na safra de cana de 2018 e 2019. Sua principal dificuldade, contudo, é o endividamento excessivo.