31/05/2018 23h20 – Atualizado em 31/05/2018 23h20
Impacto eleitoral: quem ganhou e quem perdeu com a greve dos caminhoneiros
Assunto polêmico e tentativa de se cacifar andam quase paralelos na política, mas em ano eleitoral, a corrida é maior, e o risco, também
Por Débora Álvares e Sérgio Luis de Deus
A paralisação dos caminhoneiros desencadeou uma corrida entre os políticos para ver quem conseguiria faturar politicamente com a crise, por pior que isso possa parecer. O que se viu nos últimos dez dias, desde que a greve começou, foi uma série de opiniões precipitadas e equivocadas, mas também acertadas, sobre como solucionar o problema e atender às demandas dos motoristas de carga. Qualquer ocasião serviu: eventos, entrevistas, discursos.
Nesta quarta-feira (30), pela primeira vez, a paralisação começou a dar sinais de enfraquecimento. Resta saber como isso irá se refletir nas urnas em outubro. Quem terá mais sucesso, só em algumas semanas para avaliar. Leia a seguir alguns palpites sobre quem perdeu e quem mais ganhou com a greve dos caminhoneiros.
Quem perdeu
Michel Temer
O presidente Michel Temer (MDB) sofreu um forte abalo político com a greve dos caminhoneiros. A oposição usou a oportunidade para ampliar as críticas à política econômica da gestão dele. E até aliados aproveitaram o momento para discordar do governo. Logo no momento em que ele completava dois anos de gestão, com bons índices na economia: controle da inflação, baixa histórica na taxa de juros e retomada do crescimento, ainda que tímido.
A incapacidade de seu governo de prever a paralisação e de negociar com os motoristas de carga a tempo de evitar maiores danos à população ficou evidente. O caos da falta de combustível e de desabastecimento em supermercados seguramente desgastou ainda mais a imagem de Temer, que hoje só agrada 6% dos brasileiros – o mais baixo índice de aprovação desde a redemocratização.
Rodrigo Maia
Pré-candidato à Presidência da República, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) tentou largar na frente na crise com os caminhoneiros e faturar politicamente em cima disso, mas queimou a largada. Primeiro anunciou na internet que o governo ia zerar a Cide sobre os combustíveis para tentar conter a alta de preços. No dia seguinte, precisou retificar que o fim do tributo valeria apenas para o diesel e quase foi desmentido pelo ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, que foi pego de surpresa pelo anúncio feito pelo presidente da Câmara
No último dia 23, quando a mobilização dos caminhoneiros demonstrou um poder de alcance até então inimaginável e as consequências começaram a aparecer, Maia desengavetou o projeto de lei que reonera a folha de pagamento de empresas de vários setores produtivos. Articulou a inclusão de uma emenda que isenta o óleo diesel do PIS/Cofins, manobra que foi avalizada pelos demais deputados, mas não pelo governo.
As contas divergiam. Enquanto Maia sustentava que o impacto fiscal seria de R$ 3,5 bilhões, ministros colocavam um rombo na casa dos R$ 16 bilhões. No dia seguinte, o deputado precisou vir a público com uma revisão de seus cálculos, que agora mostravam uma redução de R$ 9 bilhões na arrecadação com a isenção aprovada.
Foi ridicularizado nos bastidores do governo e até pelos próprios deputados. Resolveu sair de cena no restante da semana, enquanto, no Palácio do Planalto, era assinado um acordo com parte das lideranças do movimento. O documento ignorou a questão da incidência de PIS/Cofins sobre os combustíveis.
Eunício Oliveira
Se Maia agiu com precipitação, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), pecou pela paralisia. O político cearense estava ao lado do presidente da Câmara no vídeo em que se anunciou a isenção da Cide, mas depois cometeu um erro capital.
Na quinta-feira (24), um dia após a Câmara aprovar a reoneração com o fim do PIS-Cofins sobre o diesel, o senador se ausentou de Brasília em meio à crise de desabastecimento do país provocada pela greve. Eunício viajou ao seu estado para inaugurar uma obra de importância secundária, em Fortaleza.
Foi duramente criticado pelos caminhoneiros, que esperavam que ele articulasse rapidamente a votação do projeto encaminhado pela Câmara. Diante da repercussão negativa, voltou rapidinho para a capital federal e à noite participou do anúncio do primeiro “acordo” fechado pelo governo com os grevistas. “Os ministros estavam me esperando antes de assinar. Queriam que eu participasse do pronunciamento no Palácio do Planalto”, disse o senador na noite de quinta (24). Mas o acordo acabou fracassando.
Eunício conseguiu limpar a própria barra na última terça-feira (29), quando finalmente colocou em votação a proposta de reoneração, essencial para que o governo cubra parte do rombo que virá com as concessões aos caminhoneiros – na noite de domingo (27), Temer anunciou uma redução de R$ 0,46 no diesel nas bombas de combustível. O projeto foi aprovado facilmente e restou a Temer a tarefa de vetar o artigo que fala da isenção do PIS-Cofins sobre o diesel e assumir o desgaste político.
Henrique Meirelles
Ex-ministro da Fazenda de Temer, Henrique Meirelles (MDB) assistiu de camarote a crise no governo. Contudo, não pôde comemorar muito. Há quem coloque nele a culpa pela disparada dos preços dos combustíveis, que desencadeou a greve dos motoristas de frete. Apesar de não fazer mais parte do governo, Meirelles participou de parte das reuniões do fim de semana do comitê de crise montado no Planalto. Pré-candidato presidencial pelo MDB, ele dificilmente escapa das chamas que fritam politicamente o presidente Michel Temer.
Jair Bolsonaro
Pré-candidato à Presidência, o deputado Jair Bolsonaro (PSL-RJ) foi outro que tentou faturar politicamente com o movimento grevista. Ele se apressou em ir às redes sociais apoiar a paralisação, após inicialmente criticar as manifestações com obstrução de vias. E afirmou que, caso vença a eleição de outubro, irá anistiar os caminhoneiros que tenham sido multados ou presos por causa a greve. “Qualquer multa, confisco ou prisão imposta aos caminhoneiros por Temer/Jungmann será revogada por um futuro presidente honesto/patriota”, publicou no Twitter, no domingo (27).
Ia tudo bem até vir a público, na segunda-feira (28), que Bolsonaro é autor de um projeto de lei na Câmara que pune com até quatro anos de cadeia quem impedir ou dificultar o trânsito de veículos e pedestres nas vias públicas. A proposta foi apresentada em agosto de 2016.
“A proposição é pautada na necessária preservação dos direitos individuais e coletivos dos cidadãos, vítimas de ações irresponsáveis daqueles que desprezam as liberdades do outro quando da busca de suas demandas sociais”, escreveu Bolsonaro na justificativa do projeto. Pegou mal para ele.
Quem ganhou
Márcio França
O governador de São Paulo, Márcio França (PSB), foi o primeiro chefe de Executivo estadual a assumir sua responsabilidade na tentativa de encontrar uma solução para a greve dos caminhoneiros. A alta no preço do diesel, a maior insatisfação dos motoristas de caminhão, é resultado também da incidência de ICMS, um imposto estadual, cujas alíquotas variam bastante de estado para estado. Num momento em que o próprio Palácio do Planalto convocava os estados a se posicionarem, a maioria se calou sobre a crise, como se tivessem nada com isso.
No sábado (26), dois dias após o fracasso das negociações com o governo federal, França chamou líderes dos caminhoneiros para conversar. Não se comprometeu a mexer no ICMS, mas prometeu suspender o pedágio por eixo suspenso em São Paulo, com a condição de o governo federal arcar com o custo. Essa medida começa a vigorar nesta quinta-feira (31).
O governador paulista apresentou essa saída ao Planalto, que foi incluída no último pacote de benesses para os caminhoneiros, anunciada no
domingo. O gabinete de crise montado em Brasília não deu crédito para França. Nem precisava mais. França é candidato à reeleição em São Paulo.
Romero Jucá e Randolfe Rodrigues
Sem muito esforço, os senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Romero Jucá (MDB-RR), líder do governo no Senado, tiveram a coragem de comprar uma briga com os estados – mesmo que, por enquanto, simbolicamente. Eles apresentaram uma proposta que fixa um teto para a cobrança de ICMS sobre combustíveis nos estados. Ao se justificarem, afirmaram que seus estados sofrem com a alta nos preços dos produtos devido a distância. A redução do imposto tende a baratear os preços da gasolina, etanol e diesel.
Eles garantem que o projeto será analisado nas próximas semanas pelo Senado e não vão perder a oportunidade de exaltar a ideia o quanto puder. Principalmente Jucá, que como líder do governo tem visibilidade garantida. Resta saber se, com o arrefecimento da paralisação, o teto do ICMS vai mesmo prosperar na Casa.
Raul Jungmann
Deputado federal licenciado do PPS, Raul Jungmann não será candidato na eleição deste ano. Mesmo assim, se saiu bem durante a crise dos caminhoneiros. Ministro da Segurança Pública, ele foi de longe a voz mais sóbria em meio ao caos instalado. Agiu com sobriedade e transparência nas coletivas de imprensa.
Foi o primeiro a falar sobre a suspeita de locaute no movimento, quando empregadores fazem greve, o que é proibido por lei. Destacou a Polícia Federal para investigar empresários e incentivou a atuação das Forças Armadas nos comboios para transportar medicamentos e outros produtos essenciais. E ainda acompanhou de perto as ações da Polícia Rodoviária Federal a desobstrução de estradas e nas negociações com os motoristas em greve.
Internamente, Jungmann saiu mais forte desse episódio, principalmente após o fracasso do setor de inteligência do governo, subordinado ao Gabinete de Segurança Institucional, do general Sergio Etchegoyen, que foi incapaz de prever a crise.